terça-feira, 27 de maio de 2008

Conto 3: "Traição" - Parte 12

Não conseguia encontrar as palavras certas para pronunciar na frente do miúdo, pois quem estava na sua frente era a sua ex-namorada Gabriela. Nunca supôs voltar a encontrá-la e muito menos que seria a mãe daquela criança que tanto adorava.
Agora sim, conseguiu finalmente saber quem era a pessoa que Tiago lhe fazia lembrar. As expressões, aquele olhar azul, o cabelo loiro encaracolado – era a cara da mãe. Como não conseguiu logo aperceber-se disso? Tinha apagado de vez aquela época que não queria sequer voltar a viver tais recordações.
Gabriela estava mais acabada e com um semblante triste. Mas a sua beleza era ainda bastante evidente. Talvez um pouco mais desleixada, mas nada que um belo trato a fizesse voltar a ser a mulher que conheceu.
No meio daquele silêncio que se fez quando ambos se olharam, o pequeno Tiago quebrou o gelo:
- Manuel, esta é a minha mãe, tive de lhe pedir muito para cá vir porque só tu me podias curar! – disse sorrindo com ar matreiro.
Tanto Gabriela como Manuel não queriam demonstrar nada que fizesse Tiago aperceber-se do que se tinha passado há alguns anos atrás, mas também não queriam mentir ao miúdo de que já se conheciam. Quem decidiu falar primeiro foi Gabriela.
- Bom dia Manuel, nunca imaginei que fosses o médico do meu filho e muito menos que te tivesses tornado médico, mas que grande surpresa – e virando-se para Tiago disse: - Filho, afinal a mãe e o Sr. Doutor já se conheciam há muitos anos, vivemos na mesma aldeia e fomos colegas de escola.
- Pois é, depois de saíres da aldeia já não podias saber mas decidi voltar a estudar e tirei o curso de Pediatria. É uma surpresa muito grande saber que Tiago é o teu filho, é a criança que eu mais adoro consultar e somos verdadeiros amigos – disse Manuel.
- Eu sei disso, ele não pára de falar de ti e sempre a pedir-me para cá vir. Até inventa doenças de propósito e diz que só tu o sabe tratar. Quando o levava a outro médico nunca via melhoras nele. Nós agora vivemos bastante afastados desta zona, desde que me separei do pai de Tiago – disse Gabriela um pouco timidamente, devido à relação que ambos tiveram e olhando nos olhos de Manuel, interpretando se havia algo no seu olhar que ainda lhe dissesse que a sua história lhe interessava.
- Lamento muito a vossa separação, os filhos é que sofrem com isso – disse meio encabulado e sem saber que mais pronunciar sem que Tiago percebesse que a sua mãe e ele já foram namorados e estiveram para casar – conheci o pai mas nunca supus que afinal já conhecia a mãe e fiquei muito triste quando soube que poderia não voltar a ver aqui o meu amiguinho.
De repente Tiago diz:
- Que bom que já se conheciam, agora já podemos sair todos juntos e o Manuel já pode ir comer a nossa casa não é mamã?
Gabriela ficou gelada com aquela reacção do filho e simplesmente abanou a cabeça a dizer que sim, completando:
- Sim filho, claro que pode mas moramos longe e não sei se o Manuel poderá ir porque tem muito trabalho, mas será um prazer – virou-se para Manuel sorrindo mas ao mesmo tempo com receio de obter uma recusa. Sabia que se portou muito mal no passado e provavelmente nunca seria perdoada.
Manuel não quis por enquanto contradizer Gabriela na frente do filho, teria tempo depois de pensar bem no assunto e estava ainda de cabeça quente com tais acontecimentos, decidindo responder:
- Terei de arranjar um tempinho querido, sabes que tenho muitos meninos como tu para atender. Mas prometo que irei ver-te a ti e à tua mãe e vamos fazer um grande jantar – disse fazendo-lhe carícias pela cabeça e mantendo-o no seu colo.
Vendo aquela cena Gabriela aproveitou, dado que não foi recusada e que não caísse no esquecimento, pediu o numero de telefone a Manuel para mais tarde ligar a convidar a ir lá a casa jantar.
Manuel viu-se na obrigação de o fornecer. Como é que aquele miúdo o podia fazer coisas que pensava nunca mais acontecer. Se não fosse ele, provavelmente não aceitaria qualquer convite vindo de Gabriela. Ao mesmo tempo algo o fazia palpitar com aquela aproximação. Seria por ela ou seria pelo filho?

---Trecho escrito por Paula Costa --- 27.05.2008 ----- (continua)

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